quinta-feira, 8 de abril de 2010

Uma excursão a Aparecida

O padre Alberto organizou várias excursões. A da foto abaixo acho que foi em 1960 ou 1961. Foram quatro ou cinco ônibus. Meio Grajaú acompanhou o padre até a Basílica de Nossa Senhora da Aparecida.



Na foto estão, além do padre Alberto, o Firmino, funcionário da igreja,
meus tios Rizzo e Edith, a tia Olímpia,
"seu" Azevedo (do armazem "Silva e Azevedo" da rua Borda do Mato),
 ... e muitos mais.

terça-feira, 6 de abril de 2010

Padre Alberto Teixeira Ferro e as obras da igreja (Final)

Dona Augusta


Dona Augusta era uma senhora gorda e bonachona, certamente bem mais velha do que o padre Alberto. Ao contrário do que muitos dos freqüentadores da igreja pensavam, não era sua mãe. Nem mesmo tinham qualquer parentesco.

Ela contava que seus pais haviam sido fazendeiros no Vale do Paraíba, produtores de café e proprietários de escravos. Numa das crises da lavoura perderam tudo, mudaram para a cidade e tiveram que adotar hábitos de uma vida mais simples. Mais tarde D. Augusta foi recomendada para ser a governanta do padre Alberto, na igreja do Grajaú. Não constava que houvesse sido casada ou que tivesse filhos. Sabíamos que tinha apenas uma irmã e um sobrinho que moravam em Vila Isabel. Vestia-se com simplicidade franciscana: usava invariavelmente um grande camisolão de tecido barato e calçava sandálias.

Dos velhos tempos da fazenda paterna dona Augusta não perdera o costume da grande cozinha e de preparar saborosos quitutes em quantidades muito acima do que era necessário. Vez por outra o padre reclamava dos seus excessos e ela punha-se a choramingar pelos cantos como uma criança. Mas nunca alterou seus hábitos. Os gatos refastelavam-se com os sobejos.

Além de chefiar uma equipe de quatro pessoas que respondiam pelos serviços internos da igreja, tinha a missão de ministrar aulas de catecismo para as crianças do bairro e de prepará-las para a primeira comunhão. Fazia-o com prazer, embora o excesso de peso lhe afetasse o fôlego. Da metade para o fim da classe já falava com visível esforço.

Tinha também habilidades artísticas que se manifestavam principalmente na época do Natal. Era quando se transformava na incansável artista e organizadora da montagem do grande presépio que tanto chamava a atenção das crianças. Durante vários anos foi montado no pavilhão externo e ocupava toda a extensão do palco. O cenário deveria medir mais de trinta metros quadrados. Meu irmão e eu participávamos da montagem, sempre sob sua supervisão. Não lhe escapava um detalhe. Ficava realmente um trabalho bonito e era muito elogiado. Nos últimos anos, passou a montar o presépio em escala mais reduzida, dentro da igreja. É dessa fase o presépio que aparece numa das fotos que o padre Alberto mandou fazer em 1965 para o álbum do 4º centenário da cidade do Rio de Janeiro.

Consta que faleceu ainda nos anos 60.

sábado, 3 de abril de 2010

Padre Alberto Teixeira Ferro e as obras da igreja (II)

(continuação)

A estrutura de apoio também foi muito melhorada. O terreno onde se situava a igreja era bastante amplo e ganhou novas instalações. Do lado da sacristia, na parte mais arborizada do terreno, o padre mandou construir um enorme viveiro, capricho da dona Augusta. Foi povoado com muitas aves que nós desconhecíamos. Os que mais encantavam a dona Augusta eram os melros pretos, de belíssimo canto, e as pernaltas saracuras. A lista era grande e incluía nhambus, canários, periquitos, sabiás e vários outros. Havia até um pavão, mas este ficava solto pelo quintal.

Na parte que fazia limite com a Padaria Caprichosa havia alguns cômodos que serviam como depósito. Foram muito úteis para guardar as caixas de refrigerantes que matavam a sede da garotada nas inesquecíveis “Ruas de Recreio”, patrocinadas pelo jornal “O Globo” e pelos fabricantes da Coca-Cola. Era um programa que oferecia atividades recreativas à garotada em férias. Vários instrutores organizavam jogos e brincadeiras, e não faltava o lanchinho, com refrigerantes. Ali no Grajaú as atividades se concentravam na praçinha e contavam com o apoio logístico da igreja para guardar os equipamentos e as bebidas. Nessa época a coca-cola estava distribuindo miniaturas e bonequinhos de personagens do Walt Disney, feitos em plástico branco.

Foi também melhorado o grande galpão coberto para as aulas de catecismo, mas para justificar os novos investimentos o padre resolveu promover ali várias outras atividades. Para a garotada programou sessões de cinema; para os adultos assuntos mais sérios. Lembro-me que um dia esteve lá o padre Quevedo em pessoa para uma palestra-apresentação sobre paranormalidade ou coisa similar. Ele fez uma sessão de hipnose que na época impressionou muito a todos.

Do lado oposto havia outra extensão de terreno. Foram ali construídos vários galinheiros e depósitos onde dona Augusta mantinha sua criação de galinhas e gansos, além de incontáveis gatos que estavam permanentemente à espreita de comida. Vez por outra, em plena missa, um gato saltava por um dos vitrais que dava diretamente atrás do altar mor. O padre mandava logo despachar o bichano para não desconcentrar a atenção dos fiéis sobre os seus incansáveis peditórios.

Certa vez o padre resolveu fazer uma campanha para arrecadar livros, revistas e jornais velhos. Como não eram ainda muitos os paroquianos que possuíam carro, tínhamos que ir buscar o material na casa dos doadores e coloca-lo num desses depósitos. O trabalho era pesado, mas tinha suas compensações: passei muitas horas desfrutando de leituras que de outra forma não conseguiria ter acesso.

Como toda obra que se preze, aquelas não se contiveram no valor orçado. Lá pela tantas o padre deu para ficar aflito com as finanças. Passou a adotar um severo regime de controle de gastos. Nada nem ninguém escapava dos seus controles. A função de coroinha teve que se adaptar às exigências da logística economizadora. Só podíamos acender as luzes da igreja no exato momento em que o celebrante estivesse se dirigindo para o altar, assim mesmo só as essenciais. E a primeira coisa que fazíamos ao retornar para a sacristia era apagá-las. Aos domingos, quando a igreja estava sempre cheia, principalmente na missa das dez e das onze, ou na das seis da tarde, o calor exigia que fossem ligados os ventiladores. Mas só nos autorizava acioná-los na hora da homilia, quando iria fazer seus peditórios.

Os grajauenses tinham bom coração e sempre acudiam aos apelos do padre. Mas nem assim ele tratava o seu rebanho com condescendência. Perdia a compostura mesmo com os mais fiéis e antigos paroquianos que lhe iam pedir autorização para casa uma filha em outra igreja. Dizia-se traído e tentava todos os argumentos para mudar a decisão. No mínimo sempre conseguia uma nova contribuição para compensar as receitas perdidas.

Sua capacidade de angariar recursos era surpreendente. Estava sempre a vislumbrar uma oportunidade nova para fazer dinheiro. Organizar romarias à Basílica de Aparecida, como a que se registrou na foto ao lado, ou produzir o “álbum turístico” mencionado, eram oportunidades que não se podiam desperdiçar. Era incansável.

Na verdade o projeto de transformar a igreja do bairro não era novo. Haviam começado em 1953 com o próprio Nardi, ainda recém chegado ao Brasil. Naquela altura o trabalho de Nardi, desconhecido em nossa terra, teve de ser valorizado pelos que contratavam seus serviços. Um documento dessa etapa ficou registrado nas páginas do Jornal do Brasil, edição de 25/07/1953, pela própria pena do Pe. Alberto. Confira:


Mas naquela época o dinheiro ainda era curto e o trabalho andou bem devagar. As primeiras telas só foram inauguradas em 1955, conforme a matéria do JB, abaixo.





(continua)